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Último dia de EES South America conta debates sobre regulação, projetos estratégicos e desafios para a transição no Brasil

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    ABSAE
  • há 6 dias
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O último dia do EES South America 2025 deixou clara a dimensão estratégica que o armazenamento de energia vem assumindo no setor elétrico brasileiro. Painéis reunindo representantes de empresas, entidades setoriais, reguladores e pesquisadores trouxeram uma narrativa coesa: a tecnologia já se provou essencial para dar flexibilidade, confiabilidade e competitividade à matriz elétrica, mas enfrenta entraves institucionais, regulatórios e tributários que precisam ser superados com urgência para que o Brasil não perca o ritmo da transição energética.


Logo no primeiro painel, especialistas reforçaram que o país chegou a um ponto de saturação da rede elétrica frente à expansão das renováveis, e que as baterias são a ponte para garantir a continuidade da liderança brasileira na transição energética. Gabriella Reigada, da Secpower, destacou que “flexibilidade é a palavra-chave do sistema elétrico hoje” e que o armazenamento também deve ser visto como instrumento de inclusão social. “As baterias têm capacidade de trazer dignidade às pessoas que ainda vivem sem acesso confiável à energia. Estamos falando de 1,2 milhão de brasileiros, que precisam dessa oportunidade para se desenvolverem economicamente.” Na mesma linha, Ana Carla Petti (Comerc Energia) ressaltou o avanço do uso de baterias no setor comercial e industrial, que cresceu 1.400% nos últimos anos e ainda pode expandir mais 200% até 2030, embora represente apenas 7% do mercado nacional. Segundo ela, aplicações “atrás do medidor” já garantem estabilidade e segurança para processos industriais críticos, enquanto outras modalidades ainda aguardam evolução regulatória.


Gabriella Reigada, da Secpower
Gabriella Reigada, da Secpower

O debate também trouxe perspectivas sobre a geração distribuída e sistemas híbridos. Daniel Maia, da Athon Energy, lembrou que o armazenamento “democratiza o acesso à energia limpa” e é um vetor essencial da descentralização elétrica, enquanto Cristiano Saito (Aggreko) destacou experiências em sistemas isolados, como em Fernando de Noronha, e oportunidades em áreas agrícolas e na Amazônia, onde muitas localidades nunca serão conectadas ao SIN. Para ele, “os BESS e as microrredes são peças fundamentais da transição, ajudando a reduzir emissões, custos e oferecendo qualidade de vida a comunidades que hoje dependem de térmicas a diesel.”


Daniel Maia, da Athon Energy
Daniel Maia, da Athon Energy

Cristiano Saito, da Aggreko
Cristiano Saito, da Aggreko

Em meio a cobranças para que as definições regulatórias sejam publicadas e acompanhem o desenvolvimento tecnológico do setor de armazenamento, a próxima sessão se debruçou sobre este aspecto, trazendo falas de representantes das principais entidades do setor.  Pedro Dittrich, da Casa dos Ventos, abriu a sessão afirmando que o momento regulatório é positivo, embora ainda faltem definições. Ele lembrou que três Medidas Provisórias (1300, 1304 e 1307) já estão em tramitação e que a Consulta Pública nº 39/2023 da ANEEL deve trazer um desenho mais claro sobre o enquadramento do armazenamento no país. “O governo tem consciência da necessidade de implementação da tecnologia e, o mais importante, tem senso de urgência”, destacou Pedro.


Pedro Dittrich, da Casa dos Ventos
Pedro Dittrich, da Casa dos Ventos

O debate ganhou força com a participação de Marcelo Cabral (ABEEólica), que defendeu que o armazenamento seja tratado como infraestrutura essencial, comparável a linhas de transmissão e subestações. Para ele, o limite do BESS não é tecnológico, mas regulatório. “Sem um marco legal claro, os projetos ficam caros, lentos e arriscados, enquanto a rede perde eficiência. Regras simples e estáveis destravariam de imediato o investimento privado já pronto para entrar”, disse. Cabral reforçou que o Congresso tem papel decisivo na criação de segurança jurídica e na eliminação de riscos de dupla cobrança pelo uso da rede, abrindo espaço para modelos híbridos que combinem receitas de energia e serviços.


O tema dos leilões públicos foi trazido por Fabio Lima (ABSAE), que defendeu a neutralidade tecnológica como princípio. Segundo ele, o BESS deve ser visto como um verdadeiro “canivete suíço” do setor elétrico competitivo na geração, na transmissão e nos sistemas isolados, substituindo térmicas a diesel e reduzindo custos da Conta de Consumo de Combustíveis, como citado por muitos durante o evento. Fabio mencionou o modelo britânico como exemplo, que tira o poder argumentativo do ônus do agente público e dá a um grupo de agentes o poder de decisão, e onde a previsibilidade regulatória e critérios objetivos permitiram a entrada massiva do armazenamento. “No Brasil já existe base legal, mas faltam critérios neutros e robustos para que o BESS concorra em igualdade de condições”, afirmou. Ele defendeu a inclusão estratégica da tecnologia nos leilões de capacidade, apontando que a classificação do leilão SISOL 2025 não capturou adequadamente os benefícios do armazenamento, sobretudo na redução do consumo de combustíveis fósseis.


Fabio Lima, da ABSAE
Fabio Lima, da ABSAE

Do lado das fontes renováveis, Talita Porto (ABSOLAR) reforçou que o armazenamento é hoje indispensável para a descarbonização global e para a competitividade industrial. “Cada MW de BESS instalado gera empregos diretos e reduz custos de energia. Uma queda de 10% no preço da eletricidade pode elevar o PIB em até 0,45%”, destacou. Talita apresentou também as deliberações da CP 39/2023, como o reconhecimento de SAEs autônomos como Produtores Independentes de Energia, ajustes tarifários e novas regras para projetos colocalizados. Para ela, a capacidade projetada de 800 MW até 2034 já está defasada. “Com a queda nos custos, avanços regulatórios e perspectivas de investimento, os números da EPE serão superados. Os investimentos podem chegar a R$ 44 bilhões até 2030, se houver marco regulatório claro e previsibilidade tarifária”, afirmou.


O peso da agenda tributária foi trazido por Ana Martinez (Recurrent Energy/Canadian Solar), que chamou atenção para a carga de até 60% sobre projetos de BESS standalone. “Sem medidas específicas, o armazenamento dificilmente ganhará escala no Brasil, mesmo com a queda dos custos globais”, alertou. Ela defendeu a criação de uma NCM específica, a inclusão do BESS no REIDI, redução de IPI sobre equipamentos e negociações no CONFAZ para mitigar o ICMS. Para Ana, o paralelo é com a energia solar: “O setor só deslanchou quando houve agenda integrada de incentivos, que reduziu a carga de quase 70% para patamares próximos a 15%.”


Ana Martinez, da Recurrent Energy/Canadian Solar
Ana Martinez, da Recurrent Energy/Canadian Solar

As discussões técnicas se conectaram a experiências concretas, como o Projeto Registro da IsaEnergia Brasil, que vem operando um sistema de 60 MWh em São Paulo desde 2022. O sistema já evitou apagões em momentos críticos como o Réveillon e o Carnaval e trouxe aprendizados importantes sobre gestão térmica, degradação de baterias e operação em múltiplos despachos diários. “O Registro provou que o armazenamento não é mais promessa, é realidade. Agora precisamos multiplicar projetos como este”, disse um executivo da companhia.


O último painel ampliou a visão para além do SIN, com foco no programa Energias da Amazônia, lançado em 2023. Em regiões onde 80% da geração era baseada em diesel, a iniciativa já reduziu o número de localidades isoladas de 211 para 175 e estabeleceu um índice mínimo de 22% de renováveis em leilões. Mais de 241 projetos foram publicados, 55% deles com uso de baterias, e um novo leilão já foi anunciado para agosto com preços entre R$ 1.200 e R$ 3.500 por MWh. “A Amazônia simboliza o desafio da transição: reduzir emissões, baixar custos e respeitar a diversidade cultural e ambiental da região”, afirmou um representante da Eletrobras, lembrando que R$ 3,7 bilhões foram destinados a projetos de infraestrutura, incluindo a integração de Macapá, Manaus e Boa Vista ao Sistema Interligado Nacional.


Frederico Taves, da Eletrobras
Frederico Taves, da Eletrobras

Nesse contexto, Guilherme Nizoli (NewCharge) destacou que a energia solar, apesar de abundante e democrática, enfrenta oscilações significativas que só podem ser superadas com o uso de baterias. “Sem armazenamento, a participação das renováveis não ultrapassa 20% ou 25%. Com baterias, as microrredes ganham robustez, desligam máquinas a diesel e aproveitam melhor a energia solar”, afirmou.


Guilherme Nizoli, da NewCharge
Guilherme Nizoli, da NewCharge

Complementando a visão técnica, Marcelo Rodrigues (UCB) reforçou o papel social da tecnologia, ao lembrar que as microrredes não apenas levam energia, mas geram produtividade e inclusão econômica na Amazônia. Segundo ele, a entrega dos sistemas envolve capacitação local em parceria com o Senai e transferência de competências para moradores da região, permitindo que comunidades operem e mantenham as estruturas. Rodrigues ainda lembrou que desafios como problemas de aterramento, que já causaram perdas em placas solares, podem ser superados com educação, inovação e parcerias regionais, consolidando a energia como vetor de desenvolvimento sustentável.


Marcelo Rodrigues, da UCB
Marcelo Rodrigues, da UCB

Ao longo de toda a jornada, um ponto ficou claro: o armazenamento de energia já cumpre funções estratégicas — reduzir curtailment, mitigar picos de demanda, substituir fósseis na Amazônia, dar flexibilidade ao SIN e gerar competitividade econômica — mas seu desafio não é tecnológico, é institucional. O setor privado já dispõe de capital e projetos prontos; falta estabilidade regulatória, segurança jurídica e condições fiscais equilibradas. Como resumiu Markus Vlasits, presidente da ABSAE, no encerramento: “O Brasil está diante de uma oportunidade única de transformar o armazenamento em ativo estruturante da transição energética. O setor já provou que a tecnologia funciona; agora é preciso dar as condições legais, regulatórias e tributárias para que ela ganhe escala e atraia investimentos bilionários.”


Markus Vlasits, presidente da ABSAE
Markus Vlasits, presidente da ABSAE

 
 
 

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